Friday, November 18, 2011

Modelos de voto e considerações sobre as eleições

Todos nós estamos acostumados às famosas cruzinhas. Seja nos testes de escolha múltipla, a responder a um inquérito.. até a informação que guardamos no computador - sob a forma de bits - são como biliões de caixinhas que podem ou não ter cruzinhas. Mas há um sítio onde eu não concordo com as cruzinhas... Nos boletins de voto.


Há uma vantagem no modelo atualmente adotado: a simplicidade. No entanto, ao ser considerada apenas a opinião que mais agrada a cada pessoa está a ser esquecida uma quantidade enorme de informação relevante.
Analisemos o cenário em que duas pessoas, o Hélio e o Guedes, vão votar. O Hélio está completamente decidido e confiante em que ter o partido 'A' no governo é a melhor opção para o país. Já o Guedes, apesar de também estar ligeiramente inclinado a votar no partido 'A', partilha muitas ideias com o partido 'B'. Como é óbvio, existem diferenças de grau de determinação na (in)decisão de cada um. No entanto, o voto que irão fazer será o mesmo, e por isso contabilizado de forma igual para o partido 'A'.
Esta discretização tão severa da opinião de cada um até pode levar a que haja vencedores injustos. Senão vejamos o seguinte exemplo:
João Partilha várias ideias com os partidos 'A' e 'B' mas decide votar no 'A'. Não concorda com nenhuma das ideias do partido 'C'.
Ricardo Partilha várias ideias com os partidos 'C' e 'B' mas decide votar no 'C'. Não concorda com nenhuma das ideias do partido 'A'.
Lúcia Partilha várias ideias com os partidos 'C' e 'B' mas decide votar no 'C'. Não concorda com nenhuma das ideias do partido 'A'.
Que partido deveria ganhar? Certamente o 'B'. No entanto, acabou por não se verificar um único voto neste partido.
Parece-me por isso bastante melhor adotar um modelo de voto que passe por atribuir uma "classificação" a cada partido, de 0 a 10, que exprima o grau de concordância que com ele se tem em termos de ideias, propostas e ideologias. No momento das contagens, seria feita e divulgada a média da "classificação" de cada partido.

Outra questão com a qual me deparo é se todos os votos devem contar o mesmo. Isto porque há pessoas que não têm a mínima noção daquilo que cada partido defende (a verdade é que muitas vezes, a culpa não é só delas), não conhecem as suas ideologias, nem deram uma vista de olhos no currículo dos principais elementos dos mesmos. Outras haverá que não conhecem certos dados politicamente relevantes como o panorama económico atual ou o estado das relações de diplomacia com os outros países.
O voto destas pessoas, muitas vezes baseado no cariz estético do logótipo dos partidos, ou porque o candidato com a gravata cor-de-rosa até distribui mais beijinhos que o da gravata cor de laranja, não devia ser valorizado da mesma forma que o daquelas que se procuraram informar e que têm mais consciência do que estão a fazer. Uma solução possível para este problema seria ter, no momento do voto, a opção de se realizar um pequeno teste de conhecimentos políticos. Este teste, constituído por perguntas de escolha múltipla (para efeitos de facilidade de correção) escolhidas aleatoriamente de um universo de milhares, poderia aumentar a influência de um voto até 50%. Teria duas perguntas sobre cada partido, e dez perguntas sobre fatos atuais importantes no panorama político. O aumento da influência do nosso voto seria proporcional ao número de respostas que acertássemos.
Segue-se uma tabela que explica como os cálculos dos resultados seriam feitos com a adoção do novo modelo e a adição do teste:
Nome votante Valores atribuídos a cada partido Classificação no teste Influência do voto
João A:9/10 | B:8/10 | C:2/10 90% 0.9 * 0.5 + 1 = 1.45
Ricardo A:1/10 | B:8/10 | C:8/10 Não quis fazer 0 * 0.5 + 1 = 1
Lúcia A:3/10 | B:6/10 | C:7/10 60% 0.6 * 0.5 + 1 = 1.3
Medias ponderadas finais:
Partido A: (1.45 * 9 + 1 * 1 + 1.3 * 3)/(1.45 + 1 + 1.3) = 4.79
Partido B: (1.45 * 8 + 1 * 8 + 1.3 * 6)/(1.45 + 1 + 1.3) = 7.31
Partido C: (1.45 * 2 + 1 * 8 + 1.3 * 7)/(1.45 + 1 + 1.3) = 5.33
Não vou dizer que este método é perfeito porque está longe disso. Tem algumas desvantagens em relação ao método atual, mas acho sinceramente que as vantagens se sobrepõem. Claro que há muitos parâmetros como o número de perguntas ou o total de influência de voto que se pode ganhar com o teste que podem e devem ser ajustados. A própria fórmula de calculo pode ser ajustada. A ideia aqui é dar o exemplo de uma alternativa que corrige vários defeitos do sistema atual.

Há uma série de argumentos previsíveis contra este método e aos quais posso tentar responder:
Classes sociais com pouco acesso à informação serão desvalorizadas, visto que as pessoas destas classes não conseguirão testes com bons resultados e o seu voto não contará tanto como o das outras.
Provavelmente, o argumento mais forte contra este método. Vão haver sempre pessoas que não têm meios suficientes para se manterem informadas. Apesar disso ser uma inevitabilidade muito infeliz, e por mais frio que possa parecer dizer isto, não se pode considerar que estas pessoas têm a mesma capacidade de saber o que é o melhor para o país do que as outras, simplesmente porque elas não têm dados para poder decidir. É como não deixar pessoas com certas doenças conduzir. É mau elas terem essas doenças, mas não podemos ignorar que elas podem por em perigo as outras pessoas se o fizerem.
As pessoas que não sabem os números não podem fazer as classificações, e os analfabetos não podem ler as perguntas do teste.
Não é necessário as pessoas escreverem números explicitamente no boletim de voto. Pode ser feita uma classificação de 0 a 10, por exemplo, por preenchimento de círculos: preencher, de 10 possíveis círculos, tantos quanto a classificação que se queira dar. Em relação à leitura das perguntas, deverá haver forma da pessoa levar um acompanhante (com o qual se sente mais à vontade do que por exemplo um funcionário da junta) que lhe leia as perguntas sem que o anonimato seja comprometido, ou seja, sem que o acompanhante possa ver as respostas da pessoa. Isto pode ser feito facilmente, basta garantir que ambos estão suficientemente longe um do outro.
A contagem de votos será mais complicada com este método e levará muito mais tempo.
Com um formulário bem desenhado, um telemóvel com uma camara, e uma aplicação que tipos lá das engenharias informáticas devem conseguir fazer, consegue-se ter um contador e calculador de votos classificativos instantâneo que com jeitinho ainda põem os dados na base de dados. Não sei como é feita a contagem atualmente, mas esta ideia do telemóvel não me parece nada má. (Claro que é preciso ter em conta aspetos como segurança e fiabilidade.)
Ao fim da tarde já os milhares de perguntas e respostas vão estar a circular na net. Alguém que vá votar a esta hora tem meios para poder saber as respostas do teste.
Se alguém tiver o tempo para num dia estudar e decorar assim tantas perguntas e respostas sobre política, vai ficar a conhecer a matéria. Portanto é legítimo que o seu voto seja valorizado, visto que vem de alguém que está consciente dos fatos.
Quem iria criar as perguntas para os testes?
Teria de haver um esforço para criar uma comissão o mais independente, competente e imparcial possível para esta tarefa.

Outros argumentos haverá contra este método. Se se lembrarem de algum é só deixar em comentário. É tudo, por hoje.

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